quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Terrestres - Ciclos

  • Gosto de ciclos. Mais um ano que se encerra. É ilusório, mas convencional. Cada aniversário e ano novo significa, em termos relativos, uma volta no Sol. E o número um é a única coisa racional – ou real – que existe. O resto é consequência. Embora nós reamente não façamos uma volta completa, pois não chegamos ao mesmo ponto do qual partimos, o simbolismo ainda vale. Se realmente conseguíssemos chegar ao mesmo ponto do qual partimos há um ano, repetiríamos a história porque um ponto no espaço-tempo contém a si mesmo e todas as possibilidades e acontecimentos. Só que, como nada fica estático neste universo, esse ponto está em algum local por aí, viajando à velocidade da luz, uma agulha perdida na imensidão abissal da realidade. Mas isso ficará para posts posteriores. Enfim, apesar de todos os excessos, a loucura do consumismo e do escapismo que todos nós nos apregoamos nesse breve período, não deixa de ser uma boa época para diminuir o ritmo, parar de trabalhar um pouco e, quem sabe, recomeçar.

    Bem, bom 2009, boi na linha, menos correria, mais ruminância, mais amor e, ilusão das ilusões e esperança das esperanças, um pouco mais de paz em corações e mentes.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Terrestres - A poesia do mercado

  • Não é lindo? Um dia um cara biliardário, babaca, americano, resolve ganhar mais dinheiro ainda. Liga pra um monte de gente de sua estirpe, todos cheios da grana do círculo de Palm Beach a Aspen, das coberturas da Quinta Avenida às praias do Big Sur, e diz que tem um esquema bárbaro para, adivinha o quê?... Ganhar mais dinheiro, é claro, com taxas absurdas e irreais de retorno financeiro. Os trouxas – e como tem trouxa no mundo! – pegam tudo o que têm – e não é pouco – e dão pro cara. Alguns hipotecam até suas mansões, afinal, viram outros colegas que investiram com o pulha tirarem grana a rodo saindo pelo ladrão. E taca a mandar grana pro gajo no golpe mais velho do mundo: a pirâmide. Esse cara é o tal do ex-presidente da Bolsa Nasdaq, Bernard Madoff, e o rombinho no cu dos outros ficou em cerca de 50 bilhões de dólares, por cima. Hoje, alguns dos milionários que deram a grana pro cara estão a procurar emprego como frentista, homem-sanduíche e quetais. Ah, nada como a doce (i)lógica do capitalismo. E sobra até sujos e rotos falando do mal lavado: o Donald Trump dizendo que o Madoff é “podre”. Pode?

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Títeres em vídeo!

Caros amigos: temos duas novas contribuições no mundo mágico do vídeo e da animação.
  1. Titere Puppet TV: produções e tentativas de animação aproveitando o teatro de bonecos para reler e rearranjar essas produções para a linguagem do vídeo. Clique aqui.
  2. Fantoche Rebelde: as criaturas da cia Miyashiro Teatro de Bonecos, como todos os proletários do planeta, passam suas horas de folga elucubrando sobre a vida e falando mal dos patrões. Clique aqui.

Ambos estão também no YouTube. Divulgação e comentários são muito bem-vindos. Valeu.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Terrestres: A merda do discurso distorcedor

  • Frase do Pedro Malbergier, editor de Dinheiro, da Folha (artigo completo aqui) “E aqueles que achavam impossível os EUA, tão "racistas e reacionários", elegerem um presidente negro e progressista de forma tão decidida? (Alguém arrisca dizer em que ano o Brasil, com muito mais afrodescendentes, terá um presidente negro?)
  • É aquela coisa. No Brasil se fez uma revolução muito antes de lá. Aqui, cujo desenvolvimento foi católico, depredador e muito mais conservador do que lá, entre outras coisas, colocamos na presidência um proletário, nordestino, pobre, sem curso superior e que, bem ou mal, colocou grana na mão dos pobres e garantiu o crescimento econômico do país como ninguém tinha feito antes ("nunca antes neste país...") e abriu milhares de vagas em universidades para o pessoal de menos renda. Porque dinheiro na mão de rico, você já sabe, não vai pra lugar nenhum além dos cofres. Rico divide mulher, mas dinheiro, nunca! (agradeço à tirinha dos Malvados, que faz essa piadinha com muito mais classe) Já riqueza na mão dos pobres é sempre distribuída.
  • E agora nosso desafio é ter um presidente negro. Putz, isso que é discurso distorcedor. Quando nosso presidente for negro, o próximo terá que ser de ascendência marciano-asiática. E quando virem que nada disso vai adiantar, vão falar: viu? Precisamos voltar ao velho psdbão e democratão. Mas fiquem tranqüilos. Serra vem aí e há todo um movimento nas entrelinhas para colocar o vampirão lá em cima. Vai pra pqp!
  • (A saga da Mera Ilusão continua. Só tô meio apurado, mas em breve virá mais um capítulo. Parem de mandar essas milhares de cartas e e-mails, ligar pra casa e invadir meu quintal, vocês estão destruindo minhas petúnias da bessarábia!)

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Terrestres - Coleção Antena na área

  • A Kafka Edições, de meu amigo Paulo Sandrini, acaba de lançar em Curitiba sua Coleção Antena, com cinco livros. São eles “Acasos Pensados”, de Luci Collin, “Arquivo Morto”, de Marcelo Benvenutti, “Inverno Dentro dos Tímpanos”, de Luiz Felipe Leprevost, “Osculum Obscenum”, do próprio Sandrini, e, atenção aí, galera, “Jornal da Guerra Contra os Taedos”, livro póstumo de Manoel Carlos Karam. O Sandrini chorava os picuás, dizendo que foi uma batalha fazer as edições, e chegamos à conclusão de que ninguém realmente disse que iria ser fácil... Prêmio supremo (suprêmio? ai!) e efêmero, o resultado final, afinal, ficou muito bom. E atenção atenção novamente. Pelo que sei (não vou falar abertamente porque, na verdade, não sei), ano que vem vem mais Karam por aí. É só aguardar o rato se esvair de tanto correr.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Terrestres: o tempo inexistente

  • Ano passado, escrevi alguma filosofia barata sobre o tempo: Tempo...,...tempo...,...tempo. E agora me deparo com Julian Barbour, físico que propõe justamente que o tempo não existe, que o que existe (talvez exista) são diversos “agoras” estáticos, os quais alguma força (talvez nossa consciência?) vai juntando para fazer algum sentido. Bem, para alguns pode parecer etéreo demais, mas também não o é a busca por deus? Para mim, pelo menos, é bastante instigante.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Visitantes Incomuns

Fundação Cultural de Curitiba/Divulgação

Jorge é meu amigo, claro. E muita gente poderá até dizer que eu puxo o saco. Não deixa de ser verdade. Antes de mais nada, ele sempre foi um mestre pra mim. De facão (espadas, para os leigos), teatro de rua e, agora, teatro de bonecos. Já nos demos porrada antes, mas agora estamos entrando na fase cachorro velho. Vemos a dureza e a mediocridade do mundo e lhe damos de volta grunhidos mal humorados de desaprovação: ele não pode nos afetar negativamente.

Ele me enche os pacotes, acha que sou vagabundo, apesar de trabalhar que nem escravo, mas, enfim, creio que tenho o espírito dos índios. Lembro na escola que o absurdo dos absurdos era ouvir o professa dizer que os portugas, ao chegarem aqui e, coitados, sem quem trabalhasse pra eles, tentaram escravizar os índios. Esses, por sua vez, vejam só, por serem preguiçosos, não serviam muito pra função, afinal, o pajé teve uma visão e verificou que o custo-benefício não era dos melhores. Êta povinho, tinha que ser brasileiro, mesmo. Então os portugas tiveram, tadinhos, de encher navios e navios de pretos pra ver se alguém nesta porra trabalhava de verdade...

Enfim, narizão de cera à parte, Jorge estreou um novo espetáculo: Visitantes Incomuns. Corajoso esse havaiano. Teatro de luva, bonecos e adereços lindos, trilha sonora de encomenda e... sem nenhuma palavra. Totalmente mudo, só em mímica e gestos. (Você já deve ter brincado de fazer as pessoas adivinharem filmes por mímica, não? Agora tente colocar um boneco em sua mão e fazer O BONECO fazer a mímica por você. Então, é isso aí, viu como é fácil essa coisa de teatrinho de bonecos?). Voltando, é espantoso como a evolução parece involução para olhos destreinados. A manipulação e o conceito causaram estranheza. Claro, apresentando no Teatro da Maria, pleno domingão no parque Barigui, as pessoas estão mais a fim de saber de entretenimento fácil, piadinhas rasas e gritaria para prender a atenção da molecada. Bom, até que o povo segurou a onda, mas no final começou um entra e sai, e gente falando: “não tô entendendo nada dessa peça”. Bom, basta prestar atenção. É uma peça infantil, entããã-ão, entendeu? Outro falando no celular pra esposa: ah, tô aqui no teatrinho, tá passando uma peça conceitual. PQP! Peça con-cei-tu-al! Insulto! Mãe dos xingamentos! Pra um ator sério, é o mesmo que chamar um escritor de literato! Acinte, horror! Mas tô só zuando.

A questã é que somos indigentes intelectuais. Tudo no Brasil ou tem que ser o hedonismo desenfreado, tipo carnaval, esfrega esfrega, beija vinte, come e limpa o pau na cortina, ou o sofrimento cristão extremo, foco na pobreza, “veja como é lindo meu documentário que mostra a vida dura dos catadores do lixão das imediações de Crateús, ganhou a palma de ouro e um prêmio de um milhão de dólares! não é um sú?” Andar na corda bamba sem cair exige concentração, treino, olhar fixo na ponta do arame, paciência e, acima de tudo, coragem. Mas, fora a corda bamba, todo o resto parece estar em falta.

A Pixar é uma das melhores empresas do ramo de cinema comercialzão da atualidade. Em todos os sentidos. Seus filmes são lindos, feitos com esmero, com preocupação extrema com o roteiro, no qual a técnica apurada acaba vindo como quase conseqüência. Em que pese ter sido comprada pela Disney, justamente para tirar esta do buraco. Os caras estão sempre na frente, sendo copiados atrás. E nunca esmorecem. Inovam, ousam. Ratatouille foi uma ousadia. Mas Wall.e se superou. O filme é lindo. Sua primeira metade não tem um único diálogo. Há cenas memoráveis, como a dança no espaço. A fita estava sendo cotada inclusive para concorrer ao prêmio principal do Oscar, o de melhor filme. Enfim, novamente, eles se colocaram anos-luz à frente de qualquer um.

Mas a Pixar hoje é uma megacorporação. Já o Jorge é a maior megaminicorporação artística de que se tem notícia. Mas a qualidade está ali, a ousadia e a vontade. Os recursos aplicados de forma coerente, tal qual a irmã gigantesca. Estou exagerando? Creio que não. Muita gente torce o nariz. Mas o que é bom é bom. O resto é encenação.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Eleven’s train

Na escola, eu e a molecada ficávamos cantando Trem das Onze em inglês. Não sei porque isso tem vindo muito na cabeça ultimamente. Como não tenho nada melhor pra fazer nem pra postar, vai aí a pérola de tradução que fazíamos pro inglês, com erros de concordância e tudo o mais. A métrica até que afinava com a melodia.

  • I can’t stay
    Any more minute with you
    I am sorry, love
    But it can’t be
    I live in Jaçanã
    If I leave this train
    That leave now at eleven o’clock
    Only tomorrow morning

    Besides this, woman
    There’re other things
    My mother don’t sleep
    While I don’t arrive
    I am single son
    Have my house to leave

    I can’t stay…
    (Repeat ad nauseum)

terça-feira, 29 de julho de 2008

Looping metropolitano

Podem até dizer que não tenho o que dizer. Que toda vez que vou pra São Paulo, tenho alguma observação, e quando fico por aqui, nada rola e o blog fica às moscas. Mas a verdade é que Curis é pacata, serena, organizada demais (relativisticamente, é claro), limpa, pequena e modestamente habitada. Já SP é aquele gigantismo que faz crescer nossos olhos e sentidos, para o bem e para o mal. E qualquer corriqueiro acontecimento passa a ser história para encher estas linguiças biteludas.

Para quem não tem tempo nem dinheiro para sair por aí a visitar o Hopi Hari, o Beto Carreiro ou mesmo o Playcenter, fique sabendo que agora você, sim, você mesmo, caro leitor, pode desfrutar do único, vibrante e emocionante “Lúúúúúúúúúpin meeeeeeeeetroplolitanooooo!” É isso mesmo, agora em SP, se você acha que pegando o metrô no Tucuruvi, ponto final, você vai conseguir ao menos entrar no vagão sem muito esforço, fique sabendo que ele já chega cheio dessas pessoas adeptas desse novíssimo esporte que só poderia ter lugar lá, na supercap.

São pessoas que precisam ir em direção ao sul, mas, como não conseguem entrar daquele lado, pegam o lado de cá e seguem até o ponto final. Lá chegando, permanecem no vagão, disputam espaço com os novos passantes, e seguem de volta, agora no trilho certo, para tentar descer em seu destino final.

Tive notícias de quem, por impossibilidade de subir na Luz no trilho norte-sul para chegar à Vergueiro (cinco estações), pegou o trem na linha sul-norte, foi até o Tucuruvi (oito estações) para fazer seu looping e voltar na direção certa até a Vergueiro (mais 13 estações). Mas tem que ver que estou falando do horário de pico, tipo 10 da matina, já que o horário de pico de São Paulo é que nem meu inferno astral, que começa exatamente um ano antes do meu aniversário.

Cara, chega a ser engraçado, de dar risada de nervoso, isso se todo mundo não estivesse se ferrando geral e sofrendo o diabo. Mas os caras do consórcio da linha amarela já mataram a charada: a culpada é a geologia. Fossem mais civilizadas, as rochas locais teriam feito maravilhas com esse nosso povo, e nosso trânsito seria muito mais organizado. Mas elas não colaboram. Se mexem, derrubam túneis, abrem crateras. Com um exemplo desse, o que esperar das formigas, humanos e outros seres rastejantes? A conta, por favor.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Terrestres - papai noel sanguinário

( AP)
  • Esse vovô aí, um solitário e contemplativo papai noel, com espessa barba branca e olhos fixos, até nos choca. Queísso, onde estão com a cabeça ao prenderem esse senhor de respeito, que professa úteis conhecimentos sobre medicina naturalista, afinal, um benfeitor da nova era, uma mente preocupada com novos paradigmas de pensamento, que não se curva diante da fixação imediatista das modas consumistas. Pois bem, esse simpático velhinho é Karadzic, o açougueiro dos Bálcãs, aquele que cercou Saravejo e disse que a cidade não iria ter que contar seus mortos, mas sim os vivos. E que agora foi preso.

  • O jornalista e quadrinista Joe Sacco tem uma ótima HQ pra quem quer saber mais: “Área de Segurança Gorazde”. Nela tem uma cena hororosa, de quando os sérvios levam dezenas de mulheres e crianças pra uma ponte na Bósnia e cortam o pescoço de uma por uma e jogam no rio. Simples assim. O horror, igual ao de Darfur, Serra Leoa, Birmânia e, por que não dizer, Guantánamo? A dica do Joe está aí. O cara é porreta. Bom pra caramba na escrita e no visual. E agora mais atual que nunca.

  • Bom também é um conto dele, publicado aqui em uma edição “Comic Book: O Novo Quadrinho Americano”, chamado “Natal com Karadzic”, em que conta como ele e dois colegas jornalistas, um deles da BBC, conseguiram, em plena guerra, uma entrevista com o líder sérvio em plena comemoração de natal, numa bucólica igrejinha de interior, cercado por famílias cheias de mulheres e crianças e com neve por todo lado. É ou não é um papai noel de verdade?

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Terrestres - Points e paradas 2

  • Ribeirão Pires no sábado, dia 24 de maio. Meu pai, o Sérgio Del Giorno original, e a Graça estão desfazendo a casa pra ir passar um ano na Austrália! Legal para os velhos. Gosto da cidade, toda montanhosa, fica na Via Anchieta, em plena área da Billings, cheia de sítios, ao lado do Caminho do Mar e de Paranapiacaba. A casa deles era bem legal, cheia de verde, no alto. Alugada. Mas quando eles voltarem, não irão mais pra lá. Vão despencar pra PG. Pena. Ficaram lá meu querido tio Beto Pinduca, a Roberta e o Igor. À noite fomos dar uma banda na cidade. É cidade do interior, mas, pela grandeza de São Paulo, como sempre, tem muita gente e faltam coisas básicas, como calçamento, organização, limpeza etc. A prefeitura aproveitou uma praça e criou uma vilazinha, casinhas em estilo montanhista europeu onde estão lojas de doce, artesanato e até um bar com música ao vivo. Ficou legal, milhares de jovens se encontrando, muitos bêbados caindo pelas tabelas e tudo o mais. Apesar do artificialismo da coisa, foi uma opção criativa.
  • Mas daí fui a trabalho outro dia desses a São Bento do Sul, divisa de SC com PR. Muito bonita, também montanhosa, com áreas verdes lindas, algum casario preservado, ruas estreitas e sinuosas – me lembrou Bath, no sul da Inglaterra (viu como eu também tenho com o que gastar?) E lá nada foi fabricado, como a vilazinha de Ribeirão. A própria cidade foi criada daquele jeito, foi sendo modelada. Tenho minhas críticas à parte chata do europeísmo daqui do sul, a falta de modos, a frieza, o orgulho malemale contido. Mas essa brancaiada também sabe como viver e dar um trato para que os ambientes fiquem agradáveis e habitáveis. E, diferente de Curitiba, fomos muitíssimos bem tratados por cada pessoa que cruzamos no caminho. E o melhor, dizem que São Bento tem uma bela festa, a Schlachtfest, em setembro, onde rola chope a rodo e a baldes. Tem também uma Maria Fumaça turística.

Putz, esqueci as alianças lá embaixo!

  • Em São Bento tem a matriz do “Puríssimo Coração de Maria”, uma bela igreja no alto de um monte. Pra chegar lá, o passante tem que subir uns oitenta degraus por onde vai vendo toda as estações daquela tortura ao Cristo que os católicos adoram: o gajo sendo condenado, sendo coroado, chicoteado, pisado e pregado até ficar de saco cheio dessa merda toda e sair voando pelo céu. Bom, a escadaria é um prato cheio pra quem quer se martirizar. Quem quiser pagar uma boa promessa, daquelas de andar de joelhos até ficarem em carne viva, aí está uma dica. Assuntei com o Estéfano, que estava comigo (a foto é dele, aliás), que estava faltando um acesso para deficientes. Daí imaginamos que talvez em épocas festivas, com muito fluxo de crentes, eles coloquem um Cristo no pé da escada. O cara de cadeira de rodas chega, e o Messias diz: levanta e anda. E o cara consegue, a muito custo, por falta de prática, subir a escadaria. Chegando lá em cima, a mágica termina e o cara se estatela no chão. Pelo menos já está na igreja, e a letra da lei foi respeitada. Putz.

terça-feira, 3 de junho de 2008

Terrestres - Points e paradas 1

  • Algumas coisas legais de mais uma ida a SP. No extremo norte, já Mairiporã, subindo a Cantareira de noite, bonita de vegetação, mas com a cara da megalópole, com sujeira, quebradeira no piso e um jeitão de local ótimo pra desovar uns corpos, chegamos – eu, Vanda e Vânia veiculados pela inexaurível (!) Bia – ao Velhão. É uma vila de construções antigas – velhas mesmo – de tijolo e madeira. E o dono, um coroa fanático por artigos de demolição, transformou em super point in dos descolados of northern zone. Em breve estará entrando na rota dos descolados em geral e saindo na vejinha, e daí babau, aproveite enquanto é tempo.
  • Tem várias lojas de artesanato, de quinquilhaterias em geral a cachaça; tem uma marcenaria onde os caras trabalham até de noite fazendo peças e recuperando outras. Tem um restaurante; uma pizzaria; um bar com espaço pra som ao vivo (tava tocando sertanejo, arre!) e um bar de sinuca, com um balcão que é um primor. Preço da caipira até razoável, mas a cerveja meio cara (R$ 7 a de 600, que tinha, mas tinha acabado). Na volta, demos uma perdidinha e entramos em bairrão barra pesada, ruazinhas estreitas, muito cara mal encarado encostado nos muros e nos carros e tudo o mais. Coisas de São Paulo.
  • Em busca de pneus novos em pleno dia 23 de maio, entre feriado e sabadão, dei meia volta ao mundo na zona norte, do Center Norte à Vila Izolina Mazzei, da Vila Maria ao Limão. Aquelas milhares de ruazinhas estreitas, duas mãos, gente pra caralho, carro pra caralho. Você acha que está conhecendo o local, mas está muito longe de onde pensa. É tudo muito parecido. Uma porra de verão em pleno outono, fritando a tarde inteira até entrar a noite pra conseguir comprar e instalar dois pneus novos porque os anteriores foram pro saco na estrada. Mas isto não é reclamação. Pra turista como eu, é aventura, já que não preciso encarar todo dia. SP é isso aí. O resto é perfumaria.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Passagens

O homem levanta a poeira e no vento espalha o cadáver. Este se manda pro leste fingindo ir para o sul. Ao soltar os balões, o cretino do padre deu a mão a netuno, ou talvez ao curupira, que ao ver tal massa de carne disforme, concedeu: que tuas mãos limpas sirvam de aperitivo aos besouros e aos vórtices de moscas varejeiras. No ínterim, no porto sul, um barco de nenhuma vela e um único convés mal-cheiroso partia enquanto seu comandante e seus três únicos asseclas desejavam evitar o breu que se aproximava.

Na sala de visitas de dona Carminha, no decorrer daquela noite, a novena chegava com um grupo lamentoso, e ela, tão desejosa de provar sua fé, colocara o menino nu numa pequena manjedoura e preparara limonada gelada para todos os passantes. Na capital, atrás do balcão de um dos únicos postos 24 horas da cidade, Firmino, negão cabeludo e serião, homem de confiança do local, há anos escolado com a fauna das imediações, olhava a ponta de uma pistola mal ajambrada nas mãos de um moleque branquelo, ladeado por dois desajeitados colegas. A pressão no gatilho ia se tornando mais forte enquanto Firmino disparava com seu vozeirão ameaças aos bandidinhos, que logo se viram em expressão de puro horror quando o gatilho foi acionado e a arma falhou, ao mesmo tempo em que um sorriso diabólico se estampava no rosto do negão.

Nas barrancas do Iguaçu, ao longe o operário vislumbrava o céu em busca de luzes, e assim que percebeu o balão de são joão cair em uma parábola imperfeita, não teve tempo de nada além de pegar sua longa vara de bambu e subir desabaladamente as escadas em caracol intermináveis que rodeavam o grande tanque de crude para tentar evitar o pior. Não muito longe, em um motel quase barato, mas familiar, Ziberline explorava os mais recônditos cantos entre as coxas de sua antiga e somente agora conquistada amada, fazendo-a gemer e pedir por mais e mais e gritar obscenidades cada vez mais chulas, o que trazia a ele a plena satisfação de perceber que pelo menos alguma coisa na vida ele aprendera a fazer direito.

Quatrocentos quilômetros ao norte, sob as mesmas estrelas, estava Amanda, solitária em seu minúsculo quintal de periferia abarrotado de varais repletos de roupas lavadas, que disputavam espaço com restos de materiais de construção sobrados da obra não terminada de sua casa de dois cômodos, sem contar o arremedo fétido de banheiro. Estática, pensava sobre o que fazer para Vladimir deixar de visitá-la bêbado e bater nela e nas crianças, privando-a periodicamente da fátua felicidade que havia arduamente conquistado depois de anos de labuta. Mais acima, em um dos mais altos andares de um dos mais espetaculares edifícios da orla, Américo do Valle sorria esgarçadamente ao ser chupado por duas piranhas e um travesti enquanto seus outros colegas de festa enfiavam suas máquinas de aspirar em uma pequena montanha de pó sobre a mesa de vidro que, raramente, fazia as vezes de aparo de refeições.

Na frente do espelho, Marialda mirava-se sem emitir emoção, apenas com olhar vazio desde que chegara da rua de uma das baladas iguais às de sempre e sempre com os garotos e garotas da escola. Embora não tivesse bebido, coisa rara naqueles tempos, sentia-se confortavelmente entorpecida, o que lhe dava ainda mais propensão a avaliar friamente a questão que se assomava: cortaria os pulsos ou simplesmente aguardaria ali até que sua mente e seu corpo se esvaíssem como por encanto? Ferido após ser pego com seu pelotão em treinamento por uma tromba d´água que tudo arrastou pelo caminho no meio da floresta, o aspirante Adolfo, sozinho, gelado, só se ressentia de não ter levado seu chiclete de menta, que o faria por um momento esquecer da dor lacerante causada pelo toco de pau que havia atravessado sua coxa direita. Enquanto isso, tentava se locomover no escuro para não virar comida de mamíferos superiores e mosquitos inferiores, ao mesmo tempo em que sonhava com a Rosinha, um sanduba de pernil, uma cerveja gelada e um helicóptero de resgate, exatamente nessa ordem.

No meio-fio, Zé do Bode tentava, sem sucesso, resgatar do fundo de uma boca de lobo um isqueiro zippo novinho, perdido ao lado de uma lata cheinha de fluido, o que lhe daria ascendência natural sobre o nobre fogo e o salvaria, pelo menos naquela noite, do frio do cortante vento que insistia em fustigar seus ossos. Ao raiar do dia, Armando, o vigia noturno, acorda assustado de mais uma muito bem passada noite de sono. Vai até o banheiro da empresa, lava o rosto, faz um bochecho, dá uma alisada na farda amarrotada, pega sua bolsa, passa o cartão, ganha a rua e segue para o ponto de ônibus pensando no lauto café da manhã que vai fazer quando chegar em casa, que ninguém é de ferro nesta vida.

De volta

Aos meus dois leitores. Estou de volta. Se a alguém interessar possa. Deixei de postar por falta absoluta de inspiração. E também por causa da crise de saco cheio com tudo que me assola duas vezes por dia. Bom, é isso. Novos e emocionantes posts em breve (para quem não notou, estou tirando uma). Segue já já um novinho, escrito em uma segunda-feira à mão na mesa do Mustang Sally, em Curis, ao sabor de caipiras em duplicidade e uma cerveja.

That's it.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Terrestres – novos tempos

  • > Cena: Pluto, o cachorro desastrado do Mickey (ok, ok, é esquisito um rato ter um cachorro-cachorro (Pluto) e um amigo-cachorro (Pateta), mas a coisa é assim) faz alguma confusão com um carteiro. O pobre do cara cai em um lago e todas as cartas se espalham, boiando. Meu filho João Pedro, 4 anos, vem correndo contar pra avó: vovó, vovó, o Pluto derrubou o carteiro no lago e todos os e-mails dele caíram na água!

    Muito legal.

    >> Outra cena, quando ele tinha apenas 3 anos: curtidor de música, JP sempre teve em seu quarto um velho rádio/tocador de CD. E volta e meia colocamos no outro aparelho, que fica na sala, algum som e ficamos dançando. Um dia, resolvi ouvir alguns de meus bolachões antigos, que passaram despercebidos pelo pequeno. Tirei o LP da capa, e ele, ao meu lado, arregalou os olhos e perguntou, com a maior cara de surpresa e curiosidade: papai, que negócio preto é esse aí? Expliquei que era um disco, antepassado do atual CD que ele tanto conhece. Coisas do tempo, que também já está se encarregando de aposentar essa midiazinha frágil e de pouquíssima qualidade.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Terrestres - Na lama com a Veja

  • Putz, aula de jornalismo (ou anti-jornalismo). Luís Nassif descasca a cebola de Veja, mostrando que, quando há pesquisa e fatos, não dá pra contestar. É um recadinho aos amigos, familiares, conhecidos e desconhecidos que ainda insistem em ler e acreditar nesse papel higiênico desletrado e louvar a corja de patifes da Abril e asseclas assemelhados. Ele inicia assim a série do que se pode chamar de uma reportagem sobre o lixo desse submundo:

    “O maior fenômeno de anti-jornalismo dos últimos anos foi o que ocorreu com a revista Veja. Gradativamente, o maior semanário brasileiro foi se transformando em um pasquim sem compromisso com o jornalismo, recorrendo a ataques desqualificadores contra quem atravessasse seu caminho, envolvendo-se em guerras comerciais e aceitando que suas páginas e sites abrigassem matérias e colunas do mais puro esgoto jornalístico.”

    Vale a pena ver toda a série:

    http://www.projetobr.com.br/blog/5.html
    ou
    http://luis.nassif.googlepages.com/home

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Terrestres – 2008: firmes no leme aí

  • Bem, aqui está 2008. Já no dia 7!

    > 2007 terminou com mais uma tristeza, o falecimento da Delane. Não era íntimo dela, mas do pouco que a conheci, sabia que era mais uma dessas incorrigíveis utópicas, era educadora do sistema público de ensino, despencava pra Araucária, Cachimba e região metropolitana crendo que poderia trazer alguma luz a um sistema carcomido há tempos. Enfim, fica a sincera homenagem e que seus esforços sejam reconhecidos.

    >> Fiquem atentos. O ano do porco ainda não terminou. O ano do rato vem aí. Creio que será mais alvissareiro, com agilidade, curiosidade e disposição de sobrevivência, embora se fale de (mais) catástrofes também. O ano novo chinês chega dia 7 de fevereiro. Vejam que coisa, daí a gente aprende que até na China o ano só começa depois do carnaval...