sexta-feira, 15 de abril de 2011

A infrutífera busca pela felicidade

Se você está buscando a felicidade, já começa tomando um gol antes do primeiro círculo do relógio. Buscar é perder. É colapsar a realidade em algo sobre o qual você não tem controle. Você pode encontrar algo bom ao virar a próxima esquina. Mas também pode ser uma merda completa. Assim é a vida, diriam alguns. Não sigo as regras do destino e me recuso a ser controlado dessa maneira, diriam outros.

Mas, no fim, por mais inspiração, por mais iluminação que tenhamos, estamos presos ao chão, permanentemente inseridos em uma solução de ideias, vontades, leis físicas e o além insondável de nossas mentes. Como se sabe, até um certo nível de dimensão as soluções são exatamente isso, indissolúveis.

Afinal, onde procurar? Nos livros? Por que lemos? Para aprender, para pensar, dizem uns. Eu pessoalmente leio para esquecer. Esquecer do mundo real e entrar por alguns momentos em universos idealizados, paralelos ou coisa que o valha. Tem a função de uma bebida, um baseado ou algum outro relativizante da realidade. Aprendo algumas coisas, sim, mas poucas úteis para o dia a dia. Fiz um manual de primeiros socorros um dia desses, e essa leitura me trouxe mais informação útil do que Goethe, Dostoievski ou Hemingway juntos: como fazer um torniquete, respiração boa a boca, massagem cardíaca, imobilização de membros quebrados, compressão de ferimentos.

Quem sabe aprendamos sentimentos. Mas normalmente só nos serve para vermos que nossa miséria existencial individual é partilhada em alguns aspectos com algumas das grandes mentes de nossa história. Já é alguma coisa. Os três autores citados não foram em vão. Teve uma época em que li três romances deles, um atrás do outro: As Afinidades Eletivas, O Jogador e Adeus às Armas. Foi algo estranho, pois os peguei ao acaso e, no fim, as três histórias juntas se mostraram semelhantes em sua temática: tragédias de amor, em que a vontade humana – em particular a masculina, é claro –, embebida pela paixão, se vê tolhida em sua capacidade de ação e reação, sem a força necessária para mudar um destino trágico terrível, em que só sobra a solidão. Um alto astral só.

Mesmo assim, ler ainda é melhor que o audiovisual. Filmes são legais, é claro. Mas são curtos e não permitem a você se embrenhar realmente no clima da história, como acontece com um bom livro. Estou preferindo séries, mas, mesmo assim, não vejo graça nem tenho saco pra acompanhar nenhuma. Horários, necessidade de seguir o ritmo apontado pelo diretor etc. Isso tudo acaba sendo um exercício mental que traz frustração mais do que um prazer.

Teatro? Difícil. Queria ter ido a alguns do Festival de Curitiba, mas 50 paus por cabeça em um FESTIVAL, isso mesmo, FESTIVAL, é de amargar, o retrato da classe média curitibana, que ainda vive nos anos 50. Fora que anos atrás fui em dois espetáculos, um com texto americano e alguns globais de segundo escalão, que foi OK (mais pelo texto do que pela performance). Mas em outro, de um pessoal de Londrina radicado no Rio, não me lembro o nome, acabei saindo no meio de tão chato e gritado que o espetáculo era. Sem chance. Estamos no século 21 e ainda tem ator que acha que gritando vai fazer a platéia sentir na marra o sentimento a ser expressado. Mas ainda tenho fé, um dia conseguirei. Um adendo, por incrível que pareça, ainda não vi nada que me trouxesse mais prazer, riso solto e emoção que o Juan Romeo y Julieta Maria e Los Bufos de la Matine, d’El Chonchón. Talvez a letrinha animada e mal-humorada de Jordi Bertran, com a qual quase me mijei de rir em um teatro megalotado, na última fileira. Melhor: na época, a quatro reais a entrada!

Escultura, design, pintura, performances, instalações? Pra que presenciamos? Pra que fazemos? Sabe-se lá. Pra criar ruído, criar universos, pra sermos reconhecidos. Tem gente que se arrisca até a tentar ganhar dinheiro. E o risco? Já pensou que tudo o que é imaginado existe em algum lugar? Que uma história triste pensada está lá, em looping eterno, fazendo aqueles pobres personagens sofrerem como o diabo como fazemos por aqui quando em vez? Espírito de deus! É exagero? Mas onde esses dramas devem ser encenados? Com certeza em algum lugar e tempo. Quando colocamos nossa mente para funcionar, criamos o mundo. É assim para o hinduísmo, é assim para a mecânica quântica (esta é apenas uma constatação sem a pedante tentativa de usar princípios físicos para justificar o fundamentalismo religioso de alguns, uma técnica bastante em voga hoje em dia).

Mas não é isso. É o sentimento de despertencimento, de ser zen sem o aplacamento dos desejos, o niilismo sem a coragem de estourar tudo, a religião sem fé nem escrúpulos, o heroísmo de discurso e não de prática. No fim, ninguém está buscando mais nada. Não se busca a paz, mas um arremedo dela. Busca-se no consumo uma alternativa à realização mais profunda. No status, um placebo para a importância individual no cosmos. No prazer desmedido, um preenchimento de lacunas que são tão grandes quanto o próprio universo. Pois, afinal, há modelos de universo em que estamos “dentro” com todo o resto fora. E há modelos em que estamos fora com todo o universo “dentro” de nós. Viu? Mais uma ideia estapafúrdia que se tornou real em algum lugar deste misterioso vão que fica entre nossas orelhas.