segunda-feira, 19 de abril de 2010

De volta à sujeira de 1989

Cara, realmente dá nojo. Estamos de volta no embate de 1989: Lula x Collor. Os dois personagens principais de hoje, claro, não têm o carisma daqueles lá. E muito menos um deles seria um dos brasileiros mais populares na Terra, altamente influente no modo como o antigo dito terceiro mundo se porta hoje, peitando quem se achava dono vitalício do planeta, trocando em miúdos, EUA, Europa, Japão e asseclas.

Reaças em geral podem torcer o nariz, mas o Lula is the man. Sempre votei nele porque ele é o ungido, e aqui não vai nenhuma tez religiosa dentro, quem me conhece sabe que eu perco uma unha, mas não dou mole para as religiões messiânicas. Mas porque sempre soube que ele era uma resistência. Tenho o prazer de ter participado dessa história, de ter votado nele na adversidade, de tê-lo visto naufragar contra o neoliberalismo dos anos 90, de ter confiado e agora ver que era o cara certo.

Não me venham com ladainhas. Não me venham listar corrupções. Nunca tive a ilusão de que o poder fosse limpo. É sujo, e quem se enfia nele se emporcalha. Mas venho novamente lutar contra um jogo mais sujo ainda, do poder sem escrúpulos, dos donos da mídia, dos capitalistas selvagens que, apesar de mamarem pra caralho nessa onda de crescimento econômico, se articulam porque a única coisa que veem é o cifrão na frente, a lavagem cerebral da privatização de tudo, a ideia de que colocar movimentos sociais e pobres na linha do diálogo – ou do simples atendimento de desejos básicos como uma coca-cola, geladeira, casa, carro e até viagem de avião – é algo negativo, algo condenável.

Não adianta vir com discurso. A questão não é saber da verdade. Mas saber qual é a verdade que você tem. Quando todas as grandes mídias se reúnem sob o Instituto Millenium e falam com todas as letras que é preciso lutar contra o governo e, se possível, nas palavras desse gênio que alguns acham que é o Arnaldo Jabor, chegar a um momento em que acabasse essa “esquerda que não deveria existir˜, ou seja, em que teoricamente eu posso estar inserido com mais milhões de pessoas, o que eu devo esperar? Quando esse senhor aparece em horário que vale milhões na TV vociferando suas “verdades”sem um mínimo de compromisso com fatos, inventando e distorcendo, dá medo. Isso que é ser um verdadeiro democrata!

O que dizer da Veja?, ora, mas a Veja já não conta mais, não é mesmo? Nem vale a pena falar, é a borra da merda de cachorro que se limpa do sapato quando se chega da rua emporcalhando a casa toda.

E a Folha? Um abjeto grupo que apoiou a ditadura – inclusive, segundo consta em várias referências que podem ser encontradas pela rede afora, fornecendo suas prróprias kombis de entrega dos jornais para transporte de presos políticos (quer coisa mais abjeta que isso?) – e que depois reconquistou audiência com um jornalismo ágil e uma postura de estar ao lado do leitor (na época, uma falácia, mas crível para muitos, como percebemos agora) para jogar tudo fora numa relação promíscua com o PSDB e, pior, com unha e carne com o Serra, que, segundo consta também, costuma ter poder de emprego ou rua para os próprios jornalistas da casa. Que se danem, se estão lá e não se rebelam, merecem o que têm. E aquela coisa, chamada Cantanhede, toda prosa, toda animada com a festa do Serra, dizendo que a deles é uma massa “cheirosa”, só se iguala à indecência do Casoy tripudiando e humilhando os garis em rede nacional. É nesse tipo de pessoa que a classe média, infelizmente, acredita, que põe uma fé que está “isenta”, que está dizendo “a verdade”. E as mentiras – ficha falsa, artigo do estupro do Lula, a frase que Dilma não disse etc e tal? E, pior, a senhora Judith, executiva do jornal e presidente da ANJ, dizendo que os meios de comunicação devem fazer o papel da oposição que – coitadinha – está fragilizada nesse momento. Isso que é uma verdadeira democrata! Onde ela estava quando o Lula perdia uma eleição atrás da outra e a esquerda parecia fadada a sumir sob a avalanche neoliberalizante dos anos 90? Quem estendeu a mão? Quem defendeu sua existência para o aprimoramento da democracia?

O que falar da Globo, construída sob patrocínio ianque para dominar corações e mentes na ditadura, que ignorou e depois foi foi vaiada nas diretas já, que fez a edição do debate Collor X Lula, que tratou como quase inexistentes o mensalão da emenda da reeleição, a privataria, o Sivam, a paridade do dólar, o Daniel Dantas, as ambulâncias do Serra, o PCC, as enchentes de SP (tudo culpa da chuva, ao contrário do Rio, em que a culpa é só do governo) e muito, muito mais? E o jingle da campanha de seus 45 anos – com tipologia idêntica ao 45 do PSDB – e com toda a família global falando: queremos mais, a gente faz mais, a gente é mais, tipo alguma semelhança com a campanha do vampiro dos Bandeirantes do “Nós podemos mais”? Ainda bem que a blogosfera bombou e a Globo retirou a campanha do ar um dia depois de ela ter início. Eles estão vendo que logo logo vai voltar o velho e bom refrão: “O povo não é bobo…”

Enfim, é nisso tudo que tem gente que ainda acredita. Não entendem que não se trata só de uma escolha partidária, mas de modelo. Um modelo imperfeito, é claro, mas um modelo em que a gente levanta a cabeça e fala pro Obama: meu caro, aqui agora mando eu. Em que a gente pode comprar o básico e dar um presente chinês, um que seja, para o filho no Natal. Em que milhares de vagas ociosas em faculdades país afora agora estão preenchidas por alunos das classes mais baixas. Em que tem empresário enchendo o rabo de ganhar dinheiro e ainda cospe no prato que come. Um lugar em que a desigualdade está diminuindo e em que não foi preciso privatizar um único parafuso da Petrobras pra gringo nenhum. Imagina o que a direita está esfregando as mãos. Devem estar falando: vamos vender tim-tim por tim-tim. E depois que se dane. Vamos voltar a obedecer o Tio Sam, tirar os sapatos na sua presença, vamos isolar Cuba, o Irã, quem sabe a China, aquele paizinho onde não tem nenhuma democracia. E vamos dizer aos EUA que eles podem continuar a dar rios de dinheiro aos seus agricultores e podem continuar taxando nossos alimentos e nosso álcool. Vamos abaixar cabeça. Vamos nos colocar em nosso lugar, que é o terceiro mundo, e ficar feliz quando eles nos passarem a mão na cabeça de vez em quando e nos jogarem um resto de osso carcomido.

Sinceramente, não é esse lugar que eu quero viver. O governo faz coisa errada? Sim. O próximo de esquerda vai fazer merda? Provavelmente. Mas pelo menos são e serão merdas novas. Não datadas de 500 anos. E com certeza serão merdas com recursos próprios. Não emprestados a peso de ouro escravo do FMI.
  • Para uma comparação legal de 1989-2010, veja no Azenha, aqui.

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